Em Portugal, as creches e os jardins-de-infância públicos são escassos e caros. Um terço das crianças que consegue vaga passa lá mais de nove horas por dia, a maior parte do tempo a ver televisão, indica um estudo da Deco. Os especialistas criticam o "desequilíbrio".
As vagas e o custo das creches (1-2 anos) e dos jardins-de-infância (3-5 anos) são o principal problema com que se confrontam as famílias com filhos, revela o inquérito realizado a 2900 pais.
A maioria dos progenitores (71%) está insatisfeita com a oferta dessas instituições na área de residência - porque não correspondem às expectativas ou porque não têm vaga. Por precaução, 80% dos pais inscrevem os filhos com cinco meses de antecedência. Paralelamente, surge a dificuldade do preço. Duas em cada cinco famílias admitem que o encargo com a creche - entre 110 e 300 euros mensais - tem um impacto significativo no orçamento familiar. Portanto, quando estes dois problemas são superados, os pais "relativizam o resto", afirma Ana Brandão Bastos, coordenadora do estudo [ler entrevista ao lado].
Mas é o resto, defendem os especialistas ouvidos pelo JN, que "determina os adultos que estas crianças poderão vir a ser, sendo aí que o Estado deve intervir", defende Albino Almeida, presidente da Confederação Nacional das Associações de Pais (Confap).
"Televisão não substitui pais"
O facto de 69% das crianças passar mais de oito horas por dia na creche e de 90% passar a maioria do tempo a ver televisão "é inaceitável", mas não é novidade. "Este estudo confirma o que dissemos em 2008: as escolas deveriam organizar a componente de apoio à família, com actividades lúdicas, que nada têm que ver com professores. É aquilo a que os franceses chamam a Escola Maternal, ou seja, um projecto de educação com objectivos a cumprir ao nível da socialização e da motricidade - aquilo que competiria aos pais, caso não estivessem a trabalhar".
No entanto, na altura em que publicamente defendeu este projecto, foi acusado, lamenta, "de querer armazenar meninos na escola". Albino Almeida acrescenta agora: "Referia-me às crianças do 1º Ciclo, entre os 6 e os 10 anos. Afinal, esse projecto deve desenvolver-se muito mais cedo. É inadmissível que, numa creche, a actividade da criança seja baseada nas funções de adormecer e acordar, comer e ver televisão". O responsável só encontre duas soluções, e ambas passam pela intervenção do Estado: "Ou melhora a qualidade do trabalho que se faz nessas instituições para que as crianças esperem de forma correcta e positiva pelos pais, ou concede-se aos pais a redução do horário laboral durante cinco anos."
Manuel Coutinho, psicólogo Clínico e coordenador do SOS-Criança, vai mais longe. "Por um lado, o Estado deveria subsidiar as inscrições em instituições particulares; por outro, é importante facilitar a vida laboral dos pais, concedendo-lhe uma jornada contínua de trabalho até aos 12 anos da criança (seis horas em vez de oito)." E justifica: "A relação que a criança estabelece com os pais é fundamental para o seu desenvolvimento harmonioso. Isso exige tempo". Esse tempo, conclui, "não pode ser substituído pela televisão, nem a televisão, actividade passiva, pode ser substituída pelo que é o ponto de honra da educação nestas idades: ler, desenhar, fazer de conta". Qual é o tempo razoável para dedicar à televisão? Resposta peremptória: "Um filme por dia, no máximo".
Fonte:
http://jn.sapo.pt/PaginaInicial/Sociedade/Interior.aspx?content_id=1505180
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