Iniciei este blog aos 31 anos, já lá vão 14, o que me traz até a uns redondos 45. Estou, há vários meses, na perimenopausa... ciclos curtos e dolorosos, ovulações com muita dor mamária, pele seca, queda acentuada de cabelo - vocês sabem, só os cabelos brancos é que não caem - lágrima fácil, humor irrascível, paciência tornou-se um conceito abstrato, muitas dúvidas sobre o caminho a seguir, muitas memórias traumáticas a aflorar, pavimento pélvico a ceder - retocele, cistoclece, prolapsos vários - muitos suplementos, fisioterapia, acupunctura, quando possível #watsu pois a água quente embala e suaviza o corpo dorido (tal com o fazem a relaxina, dopamina e a ocitocina liberados no orgasmo que, muito provavelmente, é a melhor de todas as terapias).
Curiosamente, sinto-me mais bonita do que na juventude I.e., eu vejo as diferenças trazidas pela idade, as rugas e manchas, as formas do corpo alteradas mas sinto-me bem aqui dentro deste invólucro que já passou por tantas experiências transformadoras, 6 gestações, 3 perdas gestacionais, 1 ivg, 2 partos vaginais, 7 anos e meio a amamentar, tantas lágrimas e gargalhadas que não posso contar, milhões de kms calcorreados, muito trabalho significativo e útil e outras tantas horas de ócio ou mal empregadas, se calhar inúteis (?), milhares de horas a sa(n)grar... sangrar e sagrar a vida, é o que nós, nascidas com útero, fazemos mensalmente. Ás vezes parece que foi tudo tão intenso que não cabe nesta vida mas, sim, fui e sou eu.
Muitas vezes dou comigo a pensar e sentir a ideia, que li em tempos, de que todos os óvulos que a minha filha carrega se formaram quando ela estava dentro de mim. No meu ventre gerei não só a ela, como a vida dos meus netos, parte dela também foi gerada no ventre da minha mãe e estive eu mesma, ou parte de mim, 9 meses, no útero da minha avó materna. É esta magia, esta força criativa que celebro todos os meses, sangrando, menstruando, aceitando o potencial de geração de vida que aquele sangue encerra e, ao mesmo tempo, respeitando a oportunidade de limpeza, regeneração, morte e renascimento com que somos, ciclicamente, abençoadas.
Nos últimos meses, e pela primeira vez em muitos anos, o nevoeiro mental dissipou-se e pareço saber exatamente o que não quero na vida, onde me sinto confortável, que experiências são para mim e quais devo afastar e embora ainda não tenha percebido como agir face a estas realizações, percebo que a minha sensibilidade para o mundo que me rodeia aumentou - aliás, a minha sensibilidade aumentou e vamos ver se aprendo a canaliza-la porque isto não está fácil - sinto-me menos interventiva, e, no entanto, mais compassiva. Sinto-me também menos reativa às projeções alheias, aos retratos que fazem de mim e creio já ter percebido que os meus sonhos, gostos, alegrias e tristezas, as minhas crenças e os meus gatilhos, são para guardar e partilhar com quem me/os compreenda mesmo que isso implique guardar o meu universo criativo só para mim ou afaste pessoas, ilusoriamente, muito próximas.
Há décadas que chamo à menstruação "sangue da lua", que a ritualizo e acompanho com uma mandala lunar e passei, por observação, esta abordagem à minha filha, ainda pequena, para que possa, quando o seu útero descamar libertando o óvulo infecundo, viver esse luto simbólico, sentindo orgulho e satisfação pelo milagre da criação que o seu corpo encerra. Claro que há uma forte possibilidade de ela não ligar a nada disto e pôr um implante que a poupe ao périplo mensal, cá estarei para a apoiar também nesse processo.
Nos últimos anos, com o meu sangue, sem uso de contraceção hormonal, aprendi a respeitar os tempos e ritmos do meu corpo, pegar em menos varga física, mental e emocional, descansar mais e estar mais atenta na pré menstruação e menstruação, trabalhar mais, ser mais produtiva na ovulação, observar o que sinto e penso em cada fase do ciclo, conhecer-me e conhecer os meus desejos e limites.
Não sei como isto se vai materializar quando tiverem passado 60, 90, 400 dias sem menstruar mas espero (e sei) que seja uma nova fase de boas vivências a aprendizagens, com mais segurança e confiança em mim.
Estou mais do que pronta para passar à próxima etapa, para deixar de sangrar (imaginem que se me acaba a anemia, quanta mas vitalidade terei?) e utilizar toda a energia dissipada na menstruação noutras criações que, a seu tempo, surgirão.
É uma fase da vida muito intensa e interessante que, tal como acontece noutros processos fisiológicos da mulher, somos incentivadas a não sentir, ora usando implantes ou outros contracetivos hormonais, ora tomando antidepressivos e ansiolíticos que nos entorpecem e toldam a visão. Até agora, escolhi sentir tudo o que esta nova etapa me trouxer e, escolhi aprender sobre ela, sabendo que estou a aprender sobre mim.
A perimenopausa é a transição do corpo para a menopausa, dura cerca de 7 anos e está a (ou vai) acontecer contigo, quer o recomheças, quer não. É um processo inevitável e que pode ser doloroso, confuso mas também agravável e praseroso.
Para quem, como eu, tem filhos pequenos a perimenopausa e menopausa podem parecer uma encruzilhada pois ficamos perante a necessidade de respeitar as novas demandas e ritmos do nosso corpo físico, mental, emocional e espiritual, e a repetição do que pensamos levar à materialização da imagem de super mãe, profissional competente, esposa ideal (para quem o é) que nos guiou até aqui.
Quando olho para a minha pilha de livros vejo duas mulheres que coexistem, ainda sem saber onde está a sua síntese.
P.S. - Grupo facebook sobre estas temáticas - Círculo Dourado de Hecate - Menopausa Holística
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